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Conjunto de mesa
Cris Jardim

No Brasil e no Napa Valley

Dois jovens enólogos tocam vinícola que em seis anos saltou de 300 para 60 mil garrafas, com matriz em Garibaldi (RS), filial na Califórnia e distribuição própria em São Paulo




Tudo começou com quatro caixas de 15 quilos da uva Marselan, que logo se tornariam 45 garrafas de um vinho que até hoje segue sem nome, mas que para eles se tornou o grande marco de suas vidas. A Safra era 2017. Eles tinham apenas 21 anos. Empolgados com a experiência, resolveram ir um pouco além, debruçando-se no que viria a ser um negócio. E a produção comercial nasceu com 300 garrafas de um Cabernet Sauvignon 2017 batizado com a marca Tra Nodo. Em seis anos, a vinícola chega a 60.000 garrafas em mais de 30 rótulos autorais Super Premium e prevê um incremento de 20% até o final de 2023. Lucas Foppa e Ricardo Ambrosi, hoje com 27 anos, nem imaginavam a grande transformação que estava por vir com a jovem Tenuta Foppa & Ambrosi, tornando-se a primeira vinícola brasileira a fazer vinhos no Napa Valley, na Califórnia.

Com 300 garrafas armazenadas no porão da casa da família Ambrosi, o que a dupla de jovens enólogos se perguntava era: Como vamos transformar estas garrafas em dinheiro? Este era o grande desafio. Afinal, eles sabiam fazer vinhos, tinham coragem, mas vender era algo a ser descoberto. Atrevidos, aproveitaram cada oportunidade. E numa noite de Confraria em 2017, em uma degustação de vinhos Cabernet Sauvignon do Napa Valley, eles tiveram certeza de que era este o modelo vinícola que queriam seguir. “É pra lá que temos que ir”, proferiu Foppa. Quatro meses depois, ambos já estavam trabalhando na Califórnia, aprendendo com o mercado americano. “A gente lavava caixas com outros enólogos do mundo todo. Nosso gosto pelo trabalho conquistou a confiança de nossos superiores e fomos acumulando diversas tarefas. Aprendemos muito. Nossa jornada chegava até 15h por dia, das 5h da manhã às 20h”, conta Ambrosi. Foppa garante que esta experiência foi o grande ‘divisor de águas’ da história da Tenuta. “Enquanto estivemos lá, aproveitamos para conhecer muitos projetos. Voltamos dos Estados Unidos certos de que este seria o nosso modelo de negócio, inspirado no formato de uma vinícola chamada Pure Cru. Isso não saía da nossa cabeça. Estava na hora de deixar o porão”.

Mas para tocar o projeto da Tenuta Foppa & Ambrosi era preciso de recursos financeiros. De volta ao Brasil, ambos tiveram que manter seus trabalhos em vinícolas, enquanto avançavam em paralelo com o próprio negócio. O dinheiro de cada garrafa vendida retornava como investimento. A dupla passou por vinícolas como Chandon, Cave de Pedra, Terraças, Cave Antiga, Pizzato, Plátanos, Salton, Maximo Boschi e Aurora, além da californiana Rombauer Vineyards e da universidade espanhola de Cadiz. Em duas delas, construíram parcerias colaborativas fundamentais para a vinificação dos vinhos. Na Cave Antiga, onde Ambrosi ajudava o seu irmão que é enólogo lá, e na Plátanos, onde permanece até hoje, conciliando sua missão de elaborar os vinhos da Tenuta, podendo acompanhar de perto cada etapa do processo.

2020, o ano decisivo

A dois dias do lockdown na pandemia, em março de 2020, eles foram obrigados a alugar uma sala de 70 m² no Centro de Garibaldi, que ajudou na operação. Foi uma passagem rápida, mas que serviu de impulso para o próximo passo. Naquela época, a rotulagem era feita por eles em casa, no final do dia, após a jornada de trabalho. “Chegávamos a rotular, a mão, até às 3h da madrugada para poder entregar no dia seguinte. Algumas garrafas quebravam, estragavam rótulos”, lembra. Na metade de 2020, quando a produção já era de 30.000 garrafas, Foppa passou a se dedicar integralmente ao projeto da Tenuta. “A evolução do negócio foi rápida. Tudo foi acontecendo junto e era preciso se debruçar ainda mais sobre o negócio”, relata.



Com as vendas aumentando, a sala logo ficou pequena. Foi quando eles locaram um pavilhão de 300 m², local onde a vinícola segue até hoje, agora com uma área construída de 1.200 m², além de um jardim de 600 m² dedicado ao enoturismo. O novo espaço também contava com uma casa de pedra de meados de 1900, que foi preservada e segue sendo a fachada principal da Tenuta. No meio da mudança e aproveitando o período de férias, os sócios fizeram a primeira viagem para São Paulo e Rio de Janeiro para visitar clientes.

A nova fase foi marcada por muito trabalho. Para poder usar o porão da casa histórica foi necessário cavar, pois o pé direito era tão baixo que uma pessoa não podia ficar de pé. O padrasto de Lucas, marceneiro de profissão, levou três dias escavando com uma pá a metade do espaço. Depois, conseguiram uma máquina que entrava pela minúscula porta e em 15min a tarefa foi concluída. “Envelopamos uma geladeira usada. Íamos fazendo as coisas conforme o dinheiro ia entrando”, enfatiza Foppa. Cada investimento, mesmo que pequeno, sempre veio da venda dos próprios vinhos. Eles não tinham recursos, não têm investidores e nem vieram de famílias de produtores.

Uma caminhada coletiva

Com um conceito de descentralização de terroir, a vinícola compra toda uva usada nos seus vinhos de viticultores instalados em cidades da Serra Gaúcha, Serra do Sudeste e Campanha Gaúcha, com destaque para Bento Gonçalves, Garibaldi, Guaporé, Monte Belo do Sul, Pinheiro Machado, Pinto Bandeira e Quaraí. Hoje, a empresa mantém parcerias colaborativas para o maquinário que viabilizam todo processo.


Quem visita a Foppa & Ambrosi encontra um ambiente propício à cultura do vinho, com visitação e espaço para degustações e experiências enogastronômicas, podendo agendar almoços e jantares assinados pelo chef e sommelier mineiro Luan Damiani. A proposta é valorizar a brasilidade nos seus aromas e sabores. Vinhos e espumantes é o que não faltam para tornar cada vivência memorável. São cinco espumantes, 19 vinhos tintos, seis brancos e um rosé, todos em pequenos lotes. O maior – Insólito Corte 5 - tem apenas 5.440 garrafas.

Com estilo próprio e uma originalidade bem particular, Foppa e Ambrosi foram rapidamente conquistando o reconhecimento do mercado e logo seus vinhos começaram a figurar em cartas de importantes restaurantes do país como Dalva e Dito de Alex Atala, Empório Fasano, Olea, Cozinha de Afeto, Antica Salumeria, em São Paulo, além do Mäska, no Rio de Janeiro. “Criamos nosso estilo a pau e pedra, mas sempre buscamos as especialidades. Nossa estratégia a partir de agora é reunir valores humanos em torno da marca, da proposta, para seguir junto com a gente”, ressalta Foppa, que segue focado na área de gestão, enquanto Ambrosi lidera o processo de elaboração. Juntos, eles formam o par perfeito.

Jovem e cosmopolita

Tudo o que ia acontecendo era compartilhado pela dupla com o ex-chefe nos Estados Unidos, que logo fez uma proposta de sociedade. Os ‘guris’ mostraram que mesmo com poucos anos de experiência estão maduros para o negócio. Avaliaram muito bem o cenário, na velocidade de quem não perde tempo para uma boa oportunidade, decidindo por seguirem sozinhos no Brasil. E, numa iniciativa histórica, criaram a versão americana da Tenuta Foppa & Ambrosi nos Estados Unidos, com os sócios Alberto Mendoza e Miguel Cará. Constituída em maio de 2021, a vinícola já tem rótulo: o American Collection Foppa & Ambrosi Syrah 2021, lá custando aqui o equivalente a US$ 300. As 1.800 garrafas foram rotuladas em maio deste ano. O vinho já pode ser apreciado para quem visita a Califórnia.


A produção é conduzida sempre sob orientação dos dois jovens enólogos brasileiros. A parte operacional ficou com Mendoza e a parte corporativa com Cará. Agora, Foppa e Ambrosi dividem a rotina entre as safras no Brasil e na Califórnia. Além da filial no Napa Valley, a Tenuta Foppa & Ambrosi também possui uma unidade em São Paulo que serve de base para a distribuição própria e o atendimento aos clientes. Antes de 2023 terminar, a vinícola vai lançar novos rótulos. E sabe aquelas 45 garrafas de Marselan 2017? Restam apenas 20.

OS ENÓLOGOS

Lucas Foppa Alves – Enólogo, 27 anos, iniciou sua carreira em Enologia aos 13 anos. Formação como Técnico em Viticultura e Enologia, Tecnólogo em Viticultura e Enologia pela primeira Escola Brasileira de Enologia - Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, Campus Bento Gonçalves. A nível de especialização, cursou Pós-Graduação em Controladoria na Universidade de Caxias do Sul - UCS CARVI e estagiou em Pesquisa na Universidad de Cádiz (Espanha).

Ricardo Ferrari Ambrosi - Enólogo, 27 anos, iniciou sua carreira em Enologia aos 15 anos. Graduado como Técnico em Viticultura e Enologia e Tecnólogo em Viticultura e Enologia pela primeira Escola Brasileira de Enologia, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, Campus Bento Gonçalves. Trabalha como enólogo e consultor na Vinícola dos Plátanos / Enovitis Consultoria.

Fotos: Divulgação Foppa & Ambrosi

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